Há 4 anos...
Cheguei ao hospital, 9h20 (era suposto ser às 9h00, mas tivemos de deixar a nossa filha com a nossa amiga Sónia e a Maria, para garantir que ela ficava perto do hospital e poderia visitar-nos ainda naquele dia. Tinha 2 anos e poucos dias e como nunca tinha ficado sozinha com elas, quisemos fazer as coisas com alguma tranquilidade). Chegámos ao hospital, entrei sozinha e o médico disse-me, então, que iríamos fazer a Cesariana e passou-me às enfermeiras para me prepararem. Já sabiamos há algum tempo que seria assim... A enfermeira disse-me para vestir a bata na casa-de-banho e para colocar todos os meus pertences num saco (que me deu). Antes de ir para a casa-de-banho, expliquei-lhe que tínhamos feito um Plano de Nascimento e entreguei-lho. Na realidade, era um Plano de Cesariana Humanizada. Dias antes tínhamos feito um pedido ao Conselho de Administração da Maternidade, para que fizessem uma revisão das regras praticadas naquela Maternidade, no que dizia respeito à presença de acompanhante durante uma cesariana eletiva. Pedíamos a presença do Pai num momento tão único como é o nascimento de um bebé (que é concebido por um pai e por uma mãe) e o (re)nascimento de uma família. Nesse pedido enviei um video de uma Cesariana Humanizada, enviei o relatório de uma petição que elaborei meses antes, em conjunto com a minha amiga Isabel Faia (e com a preciosa ajuda da Enfermeira Ana Lúcia Torgal), e que já tinha sido entregue na Assembleia da República. Essa petição já tinha tido uma audição pela Comissão da Saúde, da qual resultou um relatório em que constava que a petição constituía “um importante contributo cívico, merecendo ulteriormente ponderação mais aprofundada”. Este relatório também foi entregue. Em resposta, o Conselho de Administração remeteu a decisão final para o Diretor do Serviço… que era o meu Obstetra. E assim voltámos ao ponto de partida. Portanto, neste dia, quando entreguei o Plano Nascimento (Cesariana Humanizada), eu estava nervosa, num misto de esperança e medo que nos fosse recusado o principal: a presença do meu marido no nascimento do nosso filho. Enquanto me vestia, ouvia cá fora comentários ao nosso Plano de Nascimento… “Esta mãe deve ser doida! Um plano de nascimento de uma Cesarina?!”. Quando saí, foi-me dito que o pai não poderia estar presente… E mais umas coisas que deixei de ouvir. De tudo o que tinha posto no meu Plano de Nascimento, aquilo era única coisa que eu queria mesmo. Chorei, tremi, senti uma grande revolta, senti-me invadida por uma sentimento de injustiça. Entretanto o meu marido chegou e tentou apaziguar a minha dor, a nossa dor. Ele menos esperançoso que eu, já imaginava que seria este o desfecho. Se tivesse dito ao Obstetra: “Marque cesariana na clínica X” (privada), nada disto nos era recusado. O meu marido estaria comigo e eu já sabia disso. Sou uma pessoa que luta pelas suas convicções. E se eu acredito que é uma injustiça, que não pode ser a minha capacidade financeira que vai ditar se o meu filho tem direito à presença do pai no momento do seu nascimento, então eu luto… até quando já não vale a pena lutar. E o meu marido apoiou a minha vontade, ainda que isso o impedisse de algo que ele desejava muito: estar presente no nascimento do filho. O que eu gostava de ter percebido era que a nossa luta já estava terminada quando recebemos o relatório da petição. Tudo o que podíamos ter feito, estava feito e ia continuar a desenrolar-se naturalmente (como aconteceu). Eu gostava e ter pegado na minha indignação e procurado outro sítio para o meu filho nascer (felizmente eu podia escolher uma clínica privada, mas nem todos podiam e isso incomodava-me). Outro sítio, com outr@ médic@. Estaria a respeitar os direitos do meu filho e do meu marido. Eu gostava que o meu marido tivesse sobreposto a sua vontade de ver o filho nascer à minha vontade de coerência neste processo. Nada disto aconteceu e o meu filho nasceu no meio da minha luta. O meu filho é filho da luta pela presença de acompanhante durante uma cesariana eletiva. É filho de uma Mãe que fez muito (em conjunto com outras pessoas) para mudar a forma como se nasce em Portugal, em caso de cesariana electiva. Nasceu num momento em que a Mãe estava zangada, nervosa, a tremer mais do que nunca o tinha feito numa cesariana (e aquela já era a 3ª). Ainda consegui tomar consciência do meu estado emocional quando me preparava para receber epidural. Respirei fundo, posicionei-me e pedi a uma enfermeira que me deixasse apoiar-me nela no momento que estivesse a ser injetada na coluna, porque já sabia que a probabilidade de sentir um choque elétrico era grande (já era a 3ª vez) e eu precisava de estar imóvel. Queria minimizar a possibilidade de ter movimentos involuntários naquele momento. A resposta da enfermeira (que torceu o nariz e se mostrou pouco agradada com o meu pedido) relembrou-me a razão de me sentir alterada emocionalmente. Não podia ter comigo a pessoa certa para me apoiar naquele momento. A pessoa que não ia sentir qualquer desagrado com o meu pedido e para quem era mesmo importante poder ter aquele papel. Voltei a respirar fundo, engoli o meu choro e foquei-me no mais importante: o meu bebé estava quase a chegar… E às 11h38 nascia o meu bebé. O meu último M! Obrigada querido M por nos escolheres! Estes 4 anos foram tão intensos e maravilhosos... Ajudaste a construir tantas partes desta tua Mãe em Construção. Parabéns, filho! ❤︎
0 Kommentare
|